
FALTA UM PEDAÇO
Eu ando meio de lado.
Muitos não notam.
Pensam que é meu jeito
de caminhar devagar.
Mas eu sei:
falta um pedaço.
Não foi esquecido,
foi arrancado ao longo do tempo,
entre sustos, silêncios e cicatrizes.
Mesmo assim eu sigo
Porque tem algo que me guia:
uma criança rindo à minha frente,
num carrinho vermelho,
livre, leve, inteira.
Ela sou eu também.
A parte que ficou viva,
a que não desistiu de brincar.
E eu, titubeando,
rindo às vezes,
sou quem cuida dela.
Com uma perna só.
Com tudo o que restou.
Com tudo o que sou.
Não preciso estar completa pra amar.
Não preciso correr pra chegar.
Só preciso seguir.
E nessa estrada torta,
descubro que ser inteira
é amar mesmo com a parte que falta.