
CRISTAIS E FERRO
A natureza é uma artista que nunca se repete
Pinta com lava e com orvalho.
Canta com baleias e com ventos.
Num de seus traços mais ousados moldou o ser humano —
um cristal consciente, belo, translúcido, refinado… e frágil.
Reflete o cosmos, mas pode se estilhaçar por dentro ao menor abalo.
Ao seu lado, vieram os ferros da criação:
baratas, formigas, lobos, tubarões, rústicos.
Imunes à vaidade, livres da culpa.
Não constroem templos, mas pertencem ao tempo.
Não sonham com deuses, mas não provocam o apocalipse.
O cristal humano se encantou com a própria luz —
e começou a cortar tudo ao redor.
Criou máquinas, mas esqueceu o silêncio.
Criou cidades, mas esqueceu o chão.
Criou espelhos, mas esqueceu o outro.
Hoje, o planeta respira por aparelhos,
ferido pela criatura que mais pensava.
E talvez a natureza esteja observando… esperando.
Talvez prepare uma nova tentativa —
um novo sopro, outro tipo de ser,
ou um salto dentro de nós mesmos.
Porque o cristal, embora frágil,
pode aprender a refletir sem ferir.
Pode curar com a luz, se não se perder no brilho.
E o ferro?
O ferro continua.
Sobrevive sempre, mesmo quando tudo desaba.